Por Jason Bittel
Hoje em dia não é preciso ir muito longe para encontrar narvais. Os chamados “unicórnios do mar” estão um pouco por todo o lado, seja nos pijamas ou lancheiras de crianças, em forma de bonecos de peluche ou até mesmo em conjuntos de LEGO. Mas encontrar estes animais na natureza é algo completamente diferente.
Os narvais, enquanto baleias do Ártico, podem ser encontrados maioritariamente nas águas geladas do Canadá e da Gronelândia. Os machos têm presas em espiral com dois metros e meio de comprimento que fazem com que o comprimento total dos seus corpos atinja o tamanho de um autocarro escolar, mas estas criaturas de aparência conspícua não gostam de dar nas vistas.
“São realmente umas baleias muito esquivas” diz Kristin Laidre, ecologista do Ártico na Universidade de Washington que estuda narvais há cerca de 20 anos. “São animais muito nervosos e diria até que são sorrateiros. Assustam-se facilmente, portanto não são o tipo de baleia que se aglomera em torno do nosso barco para podermos fazer observação de baleias.”
Isto faz com que a observação de narvais no seu habitat natural seja difícil, mas não impossível – isto se soubermos onde procurar.
Viver perto do gelo
Os narvais são mamíferos e precisam de regressar periodicamente à superfície da água para respirar. E apesar de conseguirem nadar muito abaixo dos blocos de gelo à procura de alabotes-da-gronelândia, bacalhau, camarões e lulas, as distâncias que conseguem percorrer são limitadas pela quantidade de aberturas no gelo.
Estas aberturas no gelo marinho são os locais ideais para se fazer observação de narvais, diz David Briggs, líder de expedições da empresa Arctic Kingdom, uma companhia de viagens especializada em safaris no Ártico, expedições polares privadas e operações de logística.
“Os narvais estão num trajeto migratório, e esta rota é interrompida pelo gelo”, diz Briggs, que trabalha na região há uma década. “Por isso, continuam a alimentar-se quando estão junto ao gelo à espera que este quebre um pouco mais, antes de poderem prosseguir para os estreitos onde têm as suas crias.”
Portanto, para vermos realmente um narval, temos de andar de moto de neve até aos limites do gelo e esperar sentados numa cadeira confortável com um par de binóculos durante horas ou até mesmo dias. Mas nem tudo é mau – existem muitas outras espécies que também migram junto ao gelo, e é possível observar um pouco de tudo, desde aves Uria lomvia, gaivotas-tridáctilas, pardelas-brancas e até baleias-brancas, ursos-polares, morsas e três espécies diferentes de focas.
Um som singular
E claro, quem fizer esta viagem e for paciente é recompensado com uma experiência narval verdadeiramente única.
Segundo Briggs, não há nada como ouvir o pshhhh de um narval pela primeira vez. O som indica que o animal acabou de expirar após um mergulho profundo na água. Tal como acontece com outras baleias, por vezes conseguimos ver as neblinas de água no ar quando os narvais aparecem. E num dia bom, podemos até ver um grupo de 50 a 100 narvais a surgir à superfície, diz Briggs.
Quando um grupo está aproximadamente a uma distância de um campo de futebol do gelo, os narvais fazem uma pausa para realizar uma série de coisas que Briggs descreve como exercícios respiratórios ruidosos. Quando Briggs tenta imitar estes sons pelo telefone, parece que o Darth Vader acabou de entrar em linha.
“É simplesmente fabuloso ficar ali sentado a ouvir aquele som”, diz Briggs.
Nadar ou remar junto às baleias
À medida que os narvais se aproximam dos limites do gelo, podemos andar de caiaque perto deles, ou até mesmo fazer mergulho livre (snorkel). Os mergulhos autónomos (com botijas de oxigénio) não são recomendados, diz Briggs, porque os narvais não gostam das borbulhas libertadas pelo equipamento.
“É uma coisa mágica”, diz Todd Mintz, revisor oficial de contas que já fez vários mergulhos com narvais durante as expedições da empresa Arctic Kingdom.
Mintz faz fotografia de natureza como passatempo e diz que há algo sobre a forma como as baleias olham para nós enquanto passamos por elas. “Qualquer animal que parece estar a olhar para nós, quase da mesma maneira que estamos a olhar para ele, é incrível.”
Mas como os narvais são naturalmente cautelosos com os humanos, temos de fazer todos os esforços possíveis para não os afugentarmos das suas áreas de caça ou para não impactar os seus movimentos de forma negativa.
Levar em consideração a conservação
Existe outra questão que se deve considerar quando se planeia uma viagem ao Ártico: o impacto que a nossa viagem pode ter nos animais, no ambiente e no planeta. Porém, quando são feitas de forma responsável, as expedições ao Ártico podem beneficiar as comunidades locais, os parques nacionais e os animais que habitam na região, porque geram receitas vitais. Antes de fazer qualquer reserva, pergunte na sua agência quais são as medidas tomadas para mitigar os impactos das viagens e de que forma ajudam as comunidades locais. E não deixe de ler os comentários de quem já visitou a região para perceber se as informações são legítimas.
Os especialistas dizem que os viajantes que querem fazer observação de narvais devem ter expectativas realistas. “Passei um mês no campo, a acampar na praia e em locais onde sabemos que os narvais vivem, e não vi nenhum”, diz Laidre. “É uma sorte conseguir ver um.”
Infelizmente, a pandemia global de coronavírus dificulta ainda mais os avistamentos de narvais na natureza. Nunavut, o território no norte do Canadá onde a Arctic Expeditions faz as suas expedições de observação, declarou o estado de emergência e encerrou escolas e gabinetes governamentais. Para respeitar as comunidades da região, a empresa diz que cancelou todas as expedições até junho de 2020 e que doou todas as provisões já adquiridas aos bancos alimentares locais.