Por Eugenio Goussinsky, do R7
A Cúpula de Líderes sobre o Clima, realizada na última semana, promovida pelos Estados Unidos, voltou a fortalecer o debate sobre a necessidade da preservação ambiental. Na conferência, mandatários de 40 países e outras lideranças globaisforam convidados a falar sobre projetos voltados à redução das emissões de carbono, do desmatamento de florestas e do combate ao aumento da temperatura do planeta.
Especialistas ouvidos pelo R7consideram urgente a retomada desta agenda ambiental para, inclusive, evitar o surgimento de novas pandemias. Elas acabam também sendo resultantes de todos esses fatores que afetam a biodiversidade e, consequentemente, a vida humana na Terra.
“É razoável afirmar que uma transformação nos modelos de desenvolvimento em direção à sustentabilidade, particularmente nos padrões de produção e consumo de alimentos, reduziria as chances de novos eventos como os que estamos vivendo atualmente”, afirma Diego Azzi, doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo e professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC.
Azzi acredita que as pandemias estão ligadas à preservação, ainda que de forma indireta, e, mesmo as metas estipuladas neste momento (50% de redução na emissão de gases até 2030 pelos Estados Unidos, por exemplo) precisam ser aceleradas para tornar o planeta mais habitável no futuro.
“Algo que a pandemia deixou claro é que não se pode deixar somente para o mercado a solução de problemas coletivos como saúde global e mudança do clima. A cooperação multilateral entre as nações e o fortalecimento dos Estados nacionais na sua capacidade de fornecer serviços públicos de qualidade será fundamental para melhor combater pandemias futuras. Neste sentido, as metas de transição para uma economia de baixo carbono devem ser analisadas tendo em mente que todas estão abaixo da ambição necessária para deter a mudança climática e quanto mais tempo levar para que essa ambição seja atingida, mais altos os custos para nossas sociedades”, observa.
Para o Alexander Turra, professor titular do IOUSP (Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo), o aquecimento global ajuda criar condições que podem facilitar surgimento de pandemias.
“O aquecimento é um estressor que somado a outros como poluição e desmatamento, causa alteração no funcionamento dos ecossistemas e faz determinados tipos de condições serem facilitadas para o surgimento de novos microrganismos com potencial de infestação de contaminação ou mesmo de mortalidade maior. Essa situação pode gerar pandemias na medida em que a aproximação do ser humano com esses ambientes se intensifique de uma forma pouco apropriada, pouco racional, degradadora”, explica.
Nesta interação, podem surgir pandemias como a da atual covid-19.
“Cria-se um contato que permite que essas alterações gerem esses tipos de pandemia, com maior patogenicidade ou trasmissibilidade, podendo surigr destas distorções na biodiversidade, de organismos da natureza para o ser humano. A raiz disso é a degradação ambiental causada por fenômenos locais e estressores globais”, acrescenta.
Aumento da temperatura
Em relação ao efeito estufa, Turra ressalta que este fenômeno é composto pelo efeito de gases que se acumulam na atmosfera e fazem com que o calor que chega na Terra, por meio do sol, não retorne totalmente para o espaço, ficando aprisionado na atmosfera, provocando o aumento da temperatura.
“Um dos desdobramentos deste aumento é fazer com que organismos que não tolerem as temperaturas tão altas acabem morrendo ou deixando de existir em deterinados locais onde as temperaturas no mar ou em terra estão aumentando. Eles passam para regiões mais frias, por exemplo, casos de peixes, pescados, recursos pesqueiros, que podem mudar de região e deixar de ocorrer em determinada localidade em que os pescadores estão acostumados”, destaca, ampliando o debate para prejuízos econômicos e sociais da degradação.
Turra diz ainda que outro efeito do aquecimento é a acidificação do oceano, com o gás carbônico se dissolvendo na água e se transformando, produzindo íons de hidrogênio e reduzindo a acidez da água.
“Isso trará prejuízo organismos que têm esqueletos compostos por carbonato de cálcio, internos ou externos, como conchas e, com isso, a capacidade protetiva e o crescimento ficam prejudicados. Todas as mudanças derivadas do aumento da temperatura no planeta, como aumento da temperatura do mar, aumento da frequência de eventos extremos, elevação do nível do mar, vão impactar em determinadas espécies ou ambientes. É uma situação bastante complexa e que precisa ser compreendida pela sociedade, para conseguirmos ter mais argumentos para reverter essa degradação ambiental”, completa.
As soluções passam por uma transformação da economia baseada em combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão) para uma economia de baixo carbono, a chamada economia limpa, conforme Turra enfatiza.
“Os combustíveis fósseis foram e ainda são fontes importantes de energia para alguns países, mas a tecnologia ja descobriu caminhos para a gente fazer essa substituição, que só não é feita por questões geopolíticas, que acabam definibdo um pouco a relação entre os países nesta frente”, ressalta.
Baseado em estimativa do feita no Canadá, há alguns anos, Turra afirma que a economia associada a essa transferência para uma energia limpa de baixo carbono representaria 33 trilhões de dólares por ano para o planeta.
“Estamos falando de caminhos muito interessantes que podem ser bastante lucrativos e ao mesmo tempo sustentáveis. Se pensarmos nos prejuízos que as mudanças climáticas vão causar na biodiversidade e nas atividades humanas, pensando na agricultura, nas ocupações costeiras, em função da elevação do nível do mar, os custos associados a reverter isso seriam enormes. Simplesmente é inteligente e racional antecipar essas mudanças e combater a crise energética para que a gente caminhe para uma economia de baixo carbono”, argumenta.
Segundo o historiador inglês Arnold Joseph Toynbee (1889-1975), até o surgimento do Homem, nenhuma espécie pré-homnídea possuiu jamais o poder de dominar ou destruir a biosfera. Neste sentido, a conscientização da sociedade é fundamental para reverter esse processo. Turra afirma:
“É muito importante a gente entender o papel da natureza, da biodiversidade e dos serviços prestados por ela, que chamamos de benefícios da natureza para as pessoas, porque realmente trazem, esses benefícios são variados e importantes, desde econômicos, até culturais e espirituais, a preservação desses ambientes é essencial para que se consiga manter o funcionamento do planeta, usamos como termo a homeostase do planeta”.
Por esta visão, em um planeta equilibrado, a vida humana na Terra se torna mais plena. A saúde do planeta, afinal, tem total relação com a saúde dos que nele habitam. E, em um planeta saudável, pandemia é um termo que não combina.