♪ OBITUÁRIO – Para quem se definia modestamente como “um ator que canta, compõe e escreve”, até que Rolando Boldrin (22 de outubro de 1936 – 9 de novembro de 2022) deixa discografia e rastro impagáveis na música brasileira ao sair de cena aos 86 anos no mesmo triste dia da partida de Gal Costa (1945 – 2022) para o infinito.
Foram nada menos do que 24 álbuns lançados por Boldrin entre 1974 e 2016. Pelos títulos de alguns desses discos – O cantadô (1974), Caipira (1981), Violeiro (1982), Resposta do Jeca Tatu (1989) – fica explícito que o artista paulista nascido na interiorana São Joaquim da Barra (SP) construiu obra musical enraizada no universo do Brasil rural dos sons caipiras, das violas e das modas.
Além de ter dado voz a esse Brasil rural nos discos, Boldrin foi também um dos principais difusores da música caipira – e dos artistas do gênero – no posto de apresentador de programas de TV como Som Brasil (1981 – 1984), Empório brasileiro (1984 – 1986), Empório Brasil (1989 – 1990), Estação Brasil (1995 – 1996) e, sobretudo, Sr. Brasil, comandado por Boldrin desde 2005 na TV Cultura até a morte do artista contador de causos, ontem, vítima de insuficiência renal e respiratória.
Como cantador e compositor, o maior sucesso de Boldrin foi Eu, a viola e Deus, música lançada pelo autor no quinto álbum, Rio-abaixo (1979). Outro sucesso do artista na música foi Vide vida marvada, do álbum Caipira (1981).
Não por acaso, essas duas músicas integram o álbum O samba está na moda (2022), gravado ao vivo pelo grupo carioca Casuarina em outubro de 2021 – mês em que Boldrin festejou 85 anos de vida – e lançado em maio deste ano de 2022 com repertório inteiramente dedicado ao cancioneiro autoral do cantador.
Foi nesse tributo fonográfico do Casuarina que emergiu parceria inédita de Boldrin com Adoniran Barbosa (1912 – 1982), Três heróis, guardada há décadas no baú de Boldrin.
Hábil no toque da viola, instrumento aprendido ainda na infância, o cantador formou a dupla Boy & Formiga na adolescência com um dos onze irmãos e chegou a gravar singles desde a primeira metade dos anos 1960, alguns em dupla com Lurdinha Pereira, mas a carreira fonográfica deslanchou somente a partir da década de 1970.
Na seara caipira em que Boldrin atuou com coerência e dedicação, a atuação do cantador encontra paralelo somente na trajetória artística da cantora e apresentadora Inezita Barroso (1925 – 2015), também difusora de um Brasil rural que insiste em permanecer vivo, alheio às modas e costumes. Nesse Brasil, a única moda é a da viola.
G1