Após 90 anos com acesso ao voto, mulheres cobram o direito de serem votadas
Noventa anos depois de conquistar o acesso ao voto, a mulher brasileira tem como desafio atual garantir o direito de ser votada em condições de igualdade com relação aos homens. A opinião é de parlamentares e convidadas que participaram nesta quinta-feira (24) de uma sessão especial do Senado para celebrar o aniversário do Código Eleitoral de 1932. O texto é considerado o primeiro diploma legal a autorizar a participação feminina nas eleições.
A sessão foi sugerida pela senadora Leila Barros (Cidadania-DF). Ela lembra que o direito de votar e ser votada no Brasil “é algo absolutamente recente” e alerta que a democracia brasileira ainda carece de meios para “assegurar equidade política entre os gêneros”.
— Somos mais da metade da população brasileira. Mas, no Congresso Nacional, compomos apenas 15% dos membros. No Poder Executivo, entre prefeitas e governadoras, o índice é ainda pior. Os números são reflexo de uma sociedade ainda patriarcal e misógina, amparada por preconceitos e falta de oportunidades para as mulheres — afirmou.
Leila defendeu a aprovação de três matérias em tramitação no Senado. O projeto de lei (PL) 4.391/2020, da senadora Simone Tebet (MDB-MS), reserva pelo menos 30% dos cargos em órgãos partidários para cada gênero. O PL 2.913/2019, da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), e a proposta de emenda à Constituição (PEC) 81/2019, da senadora Rose de Freitas (MDB-ES), estabelecem a paridade de gênero nas eleições para o Poder Legislativo. Os textos determinam, por exemplo, que uma das vagas será reservada a mulheres quando houver a renovação de dois terços do Senado.
Simone Tebet participou da sessão especial. Ela destacou a contribuição positiva da mulher na política e cobrou a participação feminina na condução de debates geralmente associados ao universo masculino, como a política e a economia.
— Sabemos fazer política. Temos prioridades. Sabemos falar de social, mas também entendemos de economia. Hoje temos quase unanimidade do Congresso quando falamos do combate à violência contra a mulher. Mas quando falamos de política, de protagonismo, de participação da mulher na política e mesmo de combate à violência política e institucional, esse é um assunto que ainda não conseguimos o apoio maciço dos nossos companheiros na classe politica e fora dela — afirmou.
A senadora Eliziane Gama, líder da Bancada Feminina no Senado, defendeu a reserva de cotas para os mandatos, e não apenas para candidaturas. Ela reivindicou ainda uma participação maior das mulheres nas instâncias decisórias dos partidos.
— A gente tem que mudar: estabelecer vaga de mandato. Argentina fez isso, Chile fez isso. Alemanha e Inglaterra estabeleceram cotas nos partidos. Você amplia a participação dentro do partido e consegue reverberar. Quem decide quem vai participar de programas e propagandas eleitorais? É o partido. Quem decide as candidaturas? É o partido. E quem está comandando os partidos? Os homens. A gente precisa ocupar o espaço — afirmou.
Para a senadora Rose Freitas, que em 2015 foi a primeira mulher a presidir a Comissão Mista de Orçamento (CMO), a correlação de forças entre os gêneros no Parlamento “é muito pesada”. Ela destacou que o machismo ainda não foi extirpado do ambiente político e cobrou união das mulheres em torno de pautas comuns, independentemente da afiliação partidária de cada uma delas.
— Temos que enfrentar os preconceitos e resistências. Ainda convivemos com muita discriminação. O voto é um caminho, é o instrumento que a gente tem na mão. Nós votamos e, portanto, decidimos uma eleição. Temos que procurar a melhor dialética possível para formar dentro da sociedade esse exército de mulheres para avançar permanentemente nas nossas conquistas — afirmou.
“Queremos poder”
A senadora Soraya Thronicke (PSL-MS) sublinhou que a conquista do voto feminino em 1932 “não foi uma concessão do mundo masculino”. Ela fez uma homenagem à mobilização e ao sacrifício das primeiras sufragistas no exterior e no Brasil, como a bióloga, diplomata e ativista Bertha Lutz.
— A conquista desse direito foi o ápice de um longo processo, com avanços e retrocessos. Nossa vitória não veio fácil. O mundo masculino nada nos concede assim facilmente. Jamais algum direito feminino chegou sem resistência — disse.
A parlamentar lembrou que, em toda a história do Brasil, apenas seis estados foram governados por mulheres. Ela afirmou ainda que, embora sejam recebidas no Poder Legislativo com “carinho, educação e elogios”, o que senadoras e deputadas eleitas querem é disputar espaço de poder.
— Quando é para disputar espaços de poder em relatorias e projetos de lei de extrema importância na economia, somos deixadas de lado. A maioria dos projetos que relatamos é sobre violência contra a mulher ou sobre os menos favorecidos. É lógico que abraçamos essas pautas. Mas nós queremos, mais do que apenas respeito e carinho, queremos poder. Não mais do que os homens, não menos. Queremos só o nosso espaço de poder — afirmou.
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) também contribuiu com a sessão especial. Ela encorajou a participação feminina na política.
— As decisões da vida de todos nós, mulheres e homens, são decisões políticas. Mulheres, quem define a vida são decisões políticas. Por isso, eu digo: venham para a política, mulheres! Somente na política é que a gente pode ajudar seu município, seu estado e seu país — afirmou.
Em uma mensagem previamente gravada, o senador Carlos Viana (MDB-MG) foi o único homem a participar da sessão especial. Ele reconheceu que “ainda há muito o que fazer” para equilibrar a participação feminina na política.
— As mulheres são mais da metade da sociedade, ganham menos do que os homens, são ainda um número menor de candidatas. As mulheres são muito bem-vindas na política. É preciso incentivar cada vez mais essa participação. Não apenas porque a lei manda. Mas para que a sociedade seja mais igual e mais justa — afirmou. (Agência Senado)
Por Conjuntura Online