Ex-juiz tenta aprimorar ferramentas de controle interno do partido, que tem integrantes na mira da Justiça, inclusive por suposto envolvimento na Lava Jato
Além de possível candidato do partido à Presidência, o ex-ministro Sergio Moro deve assumir um papel extra no Podemos. A legenda conta com a ajuda do ex-juiz da Lava Jato para ampliar e aprimorar seu programa de compliance com uma série de mecanismos de controle interno, incluindo a criação de um canal de denúncias e um portal para dar transparência à movimentação financeira da sigla mês a mês. Como mostrou o Estadão, a agremiação escolhida por Moro para se filiar abriga suspeitas de candidaturas laranjas, alvos da Polícia Federal e da própria Lava Jato.
Embora não tenha um cargo no partido, Moro tem auxiliado no processo e se comprometeu a dar sugestões para a melhoria do programa. Além da experiência como juiz que analisou os casos da Lava Jato e de comandar o Ministério da Justiça e Segurança Pública, Moro atuou no mercado privado justamente com foco em ações de compliance no último ano, quando prestou serviços à empresa de consultoria Alvarez & Marsal nos Estados Unidos.
O secretário de Transparência do Podemos, Fernando Torres, afirmou que Moro já participava do processo de implementação de compliance na sigla mesmo antes de se filiar. “Nossa presidente nacional Renata Abreu tem um ano de conversas com Moro. Todo o material que foi produzido, novo código de ética, a política de compliance, foi passado para o doutor Sergio Moro”, disse Torres ao Estadão.
O que significa compliance, programa defendido por Sergio Moro?
Uma das ideias que o ex-juiz deseja que seja colocada em prática pelo partido é a adoção da chamada due diligence, algo normalmente usado por empresas privadas para levantar informações e avaliar riscos operacionais e de contratos. No contexto partidário, a iniciativa se aplica na contratação de serviços terceirizados, como fornecedores e prestadores de serviços, e também nas doações eleitorais.
No mundo corporativo, compliance é o conjunto de regras que buscam garantir que uma empresa esteja de acordo com a legislação, “em conformidade” com a lei. O termo vem do verbo em inglês to comply, agir de acordo com a regra. No Brasil, o compliance passou a ter mais destaque depois de 2012, quando a Lei de Lavagem de Dinheiro previu que as empresas deveriam ter setores de controle interno.
Um projeto em discussão no Congresso obriga os partidos a implementar um programa do tipo para evitar casos como os revelados pela Lava Jato, em que estruturas das legendas eram usadas para movimentar dinheiro de corrupção.
Uma das linhas do projeto diz respeito justamente à due diligence. A iniciativa determina que as doações aos partidos passem por um processo de transparência e sejam levantados dados como a origem do recurso, o setor do mercado que o doador representa e o grau de proximidade dele com o poder público. O texto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa no fim de 2019, mas ficou travado e até hoje não há previsão de ser analisado em plenário.
Podemos avalia triagem para candidaturas em 2022
Outra ideia analisada pelo partido é fazer uma triagem de todas as candidaturas nas eleições de 2022. A sugestão foi dada pelo presidente estadual do Podemos em São Paulo, Igor Soares, e envolve evitar que políticos com ficha suja concorram pela legenda no ano que vem. No entanto, ainda não há uma decisão de qual instância de condenação ou denúncia seria usada para vetar candidatos.
O secretário de Transparência do partido afirmou que, antes de definir o critério da triagem, o Podemos precisa terminar de fazer um levantamento das denúncias e condenações envolvendo integrantes da sigla. “A gente quer adentrar mais, ser mais específico e ver se a pessoa tem uma condenação por improbidade administrativa, condenação por enriquecimento ilícito”, afirmou.
Apesar do discurso anti-corrupção de Moro, o Podemos possui diversos casos de suspeitas de corrupção em seus quadros, entre eles a própria presidente nacional do partido, Renata Abreu, que nega qualquer ilícito.
Outros partidos
Além do Podemos, partidos como o PSDB e MDB chegaram a anunciar nos últimos anos que iriam investir em iniciativas para aumentar a transparência, mas ainda não botaram as medidas em prática. O MDB planeja implementar o sistema de transparência no início do ano que vem, antes do início da campanha eleitoral. O PSDB ainda não deu previsão.
“Para o partido, é fundamental dar transparência à gestão. A sociedade cobra isso. Assinamos o contrato neste semestre e já iniciamos a implementação. Vai estar consolidado antes da eleição de 2022, no primeiro semestre”, afirmou o presidente do MDB, Baleia Rossi.
Por Lauriberto Pompeu