A Guerra Civil, décadas depois da morte de Franco, continua atormentando o imaginário dos espanhóis
Nenhum filme recente de Pedro Almodóvar havia feito a bilheteria decepcionante de Mães Paralelas na Espanha. O longa ficou abaixo da arrecadação esperada.
Almodóvar perdeu a mão? O problema não é esse. No texto com a entrevista do diretor na revista britânica Sight and Sound – All About Almodóvar/Tudo Sobre Almodóvar –, Maria Delgado faz uma observação pertinente. Se a gente escavar na superfície flamboyant de um filme do autor espanhol, vamos sempre descobrir que há ali um forte ponto de vista político. Isso é particularmente verdadeiro em Mães Paralelas.
Por que não convergentes? As histórias de Janis e Elena, Penélope Cruz e Milena Smit, tocam-se no hospital, onde ambas dão à luz, a mulher madura e a garota. Como num bom melodrama – como na realidade, veja-se o recente caso em Aparecida de Goiânia –, surge a suspeita de uma troca de bebês, o que força as mães a um exame de DNA. Justamente o DNA. O exame também está sendo operado pelo pai do bebê de Penélope, um antropólogo que investiga os mortos do fascismo e que tenta descobrir se o bisavô dela foi enterrado nessa cova coletiva que está sendo escavada.
É a explicação que se pode dar para o baixo desempenho comercial do filme. Esteticamente, é mais um grande, belíssimo Almodóvar. Não foi indicado pela Espanha para o Oscar. O país preferiu arriscar suas chances com O Bom Patrão, interpretado pelo marido de Penélope, Javier Bardem. Existe a expectativa de que ambos venham a ser indicados para os prêmios da Academia. Como diz o próprio Almodóvar – “Enquanto não for resolvido o problema das covas coletivas do fascismo, a questão da Guerra Civil Espanhola não estará resolvida. É simples e sério assim”.
A questão é que a Guerra Civil, décadas depois da morte do generalíssimo Franco, continua atormentando o imaginário dos espanhóis. Ainda provoca a divisão. Os crimes do fascismo. Almodóvar aborda o tema espinhoso. A superfície tem o brilho, a beleza, as cores, as interpretações, as paixões, tudo o que faz dele um dos grandes do cinema. Almodóvar e o melodrama. Almodóvar e a política. Mães Paralelas é um filmaço.
Por Luiz Carlos Merten