A Roda de Capoeira e o Ofício dos Mestres de Capoeira foram reconhecidos como Patrimônio Cultural do Brasil, em 2008, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Em 2014, a Roda de Capoeira também foi reconhecida como Patrimônio Cultural da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
O Decreto nº 3.551, de 04 de agosto de 2000, estrutura normativa que institui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, prevê a revalidação do título de Patrimônio Cultural do Brasil, em seu artigo 7º, pelo menos a cada dez anos. Se essa revalidação for negada, o registro será mantido como referência cultural de seu tempo. (1)
Alguns bens culturais já passaram pelo processo de revalidação, como é o caso da Arte Kusiwa, em 2017, seguindo de outros bens como a Festa do Círio de Nazaré, o modo de fazer a Renda Irlandesa, a Feira de Caruaru, o Frevo dentre outros.
Quando um bem cultural é reconhecido como Patrimônio do Brasil, uma política de Salvaguarda é iniciada com a participação dos detentores. Ocorrem encontros, entre reuniões e eventos, que propiciam o estabelecimento de uma política de salvaguarda.
São muitos os entraves, como as tensões inerentes a uma manifestação cultural tão diversa como a Capoeira. No entanto, o processo de diálogo segue também neste momento em que se trabalha para a revalidação dos bens culturais da Capoeira reconhecidos como patrimônio brasileiro. Neste sentido, as Superintendências Estaduais do Iphan promoveram reuniões com o intuito de apresentar e dialogar sobre o Parecer Técnico para revalidação do registro em conjunto com os coletivos da Capoeira de cada Estado.
Os capoeiristas, como detentores, reuniram-se, em sua diversidade, com o objetivo de tratar das percepções e opiniões sobre o referido Parecer, elaborado pelos técnicos do Departamento de Patrimônio Imaterial do Iphan. A primeira versão do documento foi resultante, em grande medida também, da participação dos capoeiristas por meio de seus coletivos, em reuniões promovidas pelas Superintendências regionais do Iphan quando do processo de elaboração do Relatório Periódico da Unesco sobre a Roda de Capoeira.
Esse relatório faz parte dos chamados Relatórios Periódicos, instrumentos estatutários exigidos pelo item VII – Relatórios, artigo 29º, da Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural, durante a Conferência Geral da Unesco, reunida em Paris de 17 de outubro a 21 de novembro de 1972, na sua décima sétima sessão. (2)
No processo de proteção dos bens culturais da Capoeira, em nível Nacional e Mundial, parece haver uma retroalimentação no sentido de fomentar o interesse dos detentores em se apropriar das políticas culturais a serem encetadas. A participação popular é um princípio dos Direitos Culturais explícito no texto constitucional em seu artigo 216, § 1º, nas seguintes linhas: “O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro […]”. (3).
Cada vez mais, é possível perceber o interesse dos capoeiristas de diversos níveis de imersão na arte, contribuindo com as discussões. No Ceará, os grupos se organizaram no formato de Fórum que também tiveram ecos da política nacional, cindido em dois devido a divergências político-partidárias que permearam o ambiente virtual no período de distanciamento social causado pela pandemia da Covid-19.
Se a Capoeira, no passado, lutou contra a escravidão, hoje continua sendo uma luta pelos direitos de minorias, se opondo às mazelas como racismo, machismo e homofobia. Essas lutas contra as opressões foram destacadas nas discussões. A Capoeira, como outras manifestações, é dinâmica. No entanto, precisa manter uma conexão com o passado e com a sua essência. O registro não visa engessar o bem cultural, mas, tão somente, proteger a partir de políticas com a necessária participação dos seus detentores.
Por José Olímpio Ferreira Neto e Joel Alves Bezerra