Maior floresta tropical do planeta, maior rio: a Amazônia é uma paisagem de extremos. Mas é na conexão entre esses dois elementos, a terra e a água, que desponta uma identidade fundamental da região: as áreas inundáveis. Espraiadas sobre 30% da bacia amazônica, cerca de 2 milhões de km², várzeas, igapós, baixios, campinas, manguezais e outros ambientes úmidos abrigam uma diversidade de espécies de fauna e flora e um singular modo de vida ribeirinho – animais, plantas e seres humanos adaptados para viver de acordo com um poderoso e regular período sazonal de chuvas.
O chamado pulso de inundação, causado pela concentração de chuvas nas cabeceiras dos principais rios da bacia, determina o nível das cheias e secas anuais. A previsibilidade do pulso aumenta a produção de matéria orgânica nos ecossistemas amazônicos e dá condições de vida para a biodiversidade e as comunidades humanas, num ciclo preciso que prospera há milhares de anos na imensidão verde.
Tal equilíbrio, porém, está em perigo. Diferentes causas intensificam gradativamente o nível das chuvas ou a ocorrência de secas intensas, alertam cientistas. Nos primeiros 70 anos dos registros de elevação da água no porto de Manaus, que começaram em 1902, as enchentes severas ocorreram a cada 20 anos. Nas últimas três décadas, a média caiu para quatro. De 2009 para cá, houve sete cheias extremas na Amazônia Central, incluindo as três maiores já registradas.
Essa mudança drástica no ciclo hidrológico da maior bacia hidrográfica do mundo, que abrange mais ou menos 18% de toda a água doce que chega aos oceanos, “é algo que chama a atenção”, aponta Jochen Schöngart, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Estudos recentes do órgão apontam que, ao longo dos 120 anos do registro das cheias, o nível médio da água subiu 1 metro, e a amplitude anual, que é a diferença entre o nível máximo e mínimo, aumentou 1,5 m nas últimas três décadas.