No primeiro trimestre de 2022, número de casos da doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti subiu 85% em relação ao ano passado. Entenda os fatores que contribuem para esse cenário.
Desde janeiro, o Brasil contabilizou 323,9 mil casos prováveis de dengue e 79 mortes pela doença.
Os números, disponíveis no último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, revelam um aumento de 85,6% nas infecções por esse vírus, transmitido pela picada do mosquito Aedes aegypti, em relação ao mesmo período de 2021.
Em alguns locais do país, a situação é pior: no Centro-Oeste, o crescimento em comparação com o ano passado foi de 242%. Até o momento, a região registrou 648 casos por 100 mil habitantes — em segundo lugar aparece o Sul, com 198 casos por 100 mil.
Entre as cinco cidades mais atingidas, três estão no Centro-Oeste: Goiânia (25,1 mil casos), Brasília (19,2 mil) e Aparecida de Goiânia (4,6 mil). Completam a lista Palmas (7,5 mil), no Tocantins, e Votuporanga (4,7 mil), em São Paulo.
Mas o que está por trás desse cenário? E o que pode ser feito para combatê-lo? Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil explicam que uma série de fatores combinados contribuíram para o aumento da dengue justamente neste período.
Os ingredientes de uma epidemia
Desde o final de 2021, quando começou o verão, várias cidades brasileiras registraram muitas tempestades, relacionadas a fenômenos como o La Niña e as mudanças climáticas.
Para o Aedes aegypti, as chuvas são sinônimo de água parada, local onde os ovos do mosquito eclodem e as larvas se desenvolvem até alcançarem a fase adulta.
“Geralmente, quando chega o mês de dezembro e começamos a notar uma grande concentração do Aedes, já dá para prever que março e abril vão ser ruins, com muitos casos de dengue”, observa o infectologista Celso Granato, diretor do Fleury Medicina e Saúde.
Mas, na virada de 2021 para 2022, as projeções foram atrapalhadas por outras duas crises de saúde.
Nessa mesma época, o Brasil enfrentou uma epidemia de influenza H3N2, que causou um aumento importante de casos de gripe, e o espalhamento da variante ômicron do coronavírus, por trás de recordes nos números de infecção.
“Os sistemas de vigilância da dengue foram muito prejudicados, já que nesses dois últimos anos havia um foco quase absoluto na pandemia de covid-19”, acrescenta o médico, que também é professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Ainda em relação à pandemia, o menor número de infecções em 2021 também tem a ver com os períodos de maior isolamento social, que diminuíram a locomoção das pessoas pelas cidades.
Por fim, Codeço destaca que “temos uma população empobrecida, com dificuldades de moradia, e vemos a precarização das cidades”.
A tendência, de acordo com o que aconteceu nas temporadas anteriores, é que os casos de dengue continuem a subir no país pelo menos até o meio de maio. A partir daí, com a chegada de temperaturas mais baixas nas regiões Sul, Sudeste e parte do Centro-Oeste, os registros devem voltar a cair.https://71cb6159c5cff9d0a4b7e77a6596e62a.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html
Detectadas as causas do problema, o que pode ser feito para lidar com essa epidemia oculta de dengue?
A resposta das autoridades
Como não existe uma vacina aprovada contra a dengue, as ações preventivas mais efetivas envolvem eliminar os criadouros do mosquito transmissor — e o ideal é que esse trabalho se inicie em janeiro ou fevereiro, quando os ovos começam a eclodir.
Agora em abril, existem menos ações que podem ser feitas. “Resta apostar no fumacê, que ajuda a inibir o mosquito adulto”, completa o infectologista.
Outra atitude importante é ampliar e reforçar os serviços públicos de saúde, para conseguir acolher os pacientes com complicações da dengue.
O boletim epidemiológico do Ministério da Saúde contabiliza neste ano 233 episódios de dengue grave e outros 2,8 mil com sinais de alarme. Até o momento, foram registradas 79 mortes pela doença.
Granato também se mostra preocupado com a recorrência da dengue em regiões que já tiveram surtos e epidemias num passado recente.
A BBC News Brasil entrou em contato com as Secretarias Estaduais de Saúde de Goiás, Distrito Federal, Tocantins e São Paulo, locais com as cidades mais atingidas até o momento.
A secretaria do Distrito Federal afirmou que promove sempre ações de combate ao Aedes em todas as regiões administrativas.
Já os representantes de Goiás admitem que “o avanço dos casos colocam o Estado em situação de alerta para a possibilidade de uma epidemia por dengue”.
A secretaria de São Paulo destacou que o número de casos no Estado está mais baixo (ou ligeiramente parecido) em 2022 na comparação com 2021, apesar da situação ruim de algumas cidades neste ano.
A Secretaria Estadual de Saúde do Tocantins e o Ministério da Saúde foram procurados, mas não enviaram respostas até o fechamento desta reportagem.
Falcão entende que as políticas públicas precisam se reinventar e apostar em novas tecnologias no combate ao mosquito. “Já vimos que o que tem sido feito ao longo dos últimos anos não surtiu efeito.”
O que você pode fazer
Além das políticas públicas, os especialistas chamam a atenção para as responsabilidades individuais no combate à dengue.
Aqui entram aquelas recomendações clássicas de evitar qualquer reservatório de água parada sem proteção em casa. O mosquito pode usar como criadouros grandes espaços, como caixas d’água e piscinas abertas, até pequenos objetos, como tampas de garrafa e vasos de planta.
Vale fazer uma faxina no quintal e na varanda, com especial atenção para depósitos, calhas e objetos que ficam ao relento e podem acumular água da chuva.
Instalar telas em portas e janelas ou usar repelentes na pele são atitudes que também podem ajudar.
Por fim, é importante ficar atento aos sintomas da dengue, como febre, cansaço, vermelhidão em partes do corpo, coceira e dores na cabeça, nos músculos, nas articulações ou atrás dos olhos.
Após o diagnóstico da doença, a recomendação é fazer repouso, caprichar na hidratação e, se necessário, usar remédios que aliviam alguns desses incômodos.
Por BBC