A saúde mental da população afro-brasileira é o foco do trabalho do psicólogo Lucas Veiga. A partir de suas experiências atendendo pessoas negras, ele produziu o livro Clínica do Impossível: Linhas de Fuga e de Cura, que acaba de ser lançado pela editora Telha.
Mestre em psicologia clínica pela Universidade Federal Fluminense, Veiga procura dar recursos a seus pacientes para lidarem com os desafios de um problema complexo, que não vai se resolver de forma imediata: o racismo. Ele tem se destacado na prática da chamada Psicologia Preta, que, entre suas ferramentas, recorre a sabedorias ancestrais africanas como prática de cuidado e de liberdade.
O que vem a ser e como surgiu a Psicologia Preta?
Ela surgiu no período da luta dos movimentos negros estadunidenses por direitos civis, no final dos anos 60 e ao longo dos anos 70. Naquele contexto, intelectuais negros e negras do campo da saúde mental se debruçaram para produzir conhecimento em torno das questões específicas que envolvem o cuidado em saúde mental da população negra.
Por que esse título do seu livro, “Clínica do Impossível”?
Por mais diversos que sejam, todos os meus pacientes negros e negras precisam lidar com o impossível do fim imediato do racismo e isso pode ter como resultado uma sensação de impotência e insuficiência que resvala em várias áreas da sua vida.
Reconhecer o racismo traz dor?
Sim, é fundamental que cada pessoa negra produza um discurso e uma imagem sobre si mesma conectados com sua história e com sua ancestralidade para não sucumbir ao imaginário racista presente no País.
De que forma o corpo comunica certos conteúdos para a mente fazendo deles algo diferente em negros e brancos?
Os negros sofrem violência simplesmente por terem a cor da pele e os traços que têm. Os brancos não são seguidos pelo segurança do supermercado. O que determina a suspeição nestes casos é a cor da pele, o corpo negro é lido como potencialmente perigoso na mentalidade de uma sociedade estruturalmente racista como a nossa.
O método de cura de problemas emocionais, pelo falar a longo prazo e processar traumas,é independente da raça e etnia do analista?
Não é a palavra que cura, mas a palavra endereçada a alguém, ou seja, o que produz cura é a relação terapêutica. Quem diz isso é a própria psicanálise, o próprio Freud, quando cria o conceito de transferência. Se é a relação terapêutica que produz saúde, faz diferença sim se é um homem ou uma mulher, se é um analista negro ou branco. A escolha do analista é uma decisão individual e cada pessoa pode e deve escolher um profissional com quem se sinta mais à vontade para dividir suas questões. PAULA BONELLI
Por Sonia Racy